Lauro da
Escóssia Neto
Pediram-me
para escrever sobre Lauro da Escóssia. Eu, seu primeiro neto, sua
terceira geração... Não trago no sangue seu gene de escritor e jornalista
modestamente dito de província. O que posso dizer de "vôzinho"?
Serei suspeito para falar no homem que foi avô e pai
devotado? Não. Tendo compartilhado durante toda a sua vida de suas amarguras e
esperanças, vejo-me qualificado a rememorar, não o jornalista, o memorialista e
escritor, mas o homem Lauro da Escóssia em toda sua infinita modéstia.
Em um
dia desses qualquer, às primeiras horas da Ave Maria, na Rádio Difusora
de Mossoró, lida pela voz de Genildo Miranda, um transglobe
captava suas ondas, e a brisa quente e suave trazida pelo nordeste,
embalava prazerosamente a cadeira de balanço de seu Lauro, em sua calçada à rua
Dr. Mário Negócio, 158.
Normalmente,
à exceção da segunda-feira, que era dia de Maçonaria, estava em sua
calçada, à luz do poste da "Comensa" localizado exatamente em frente
à porta principal de sua casa.
Ali sentado
com a companheira de toda sua vida, dona Dolora, rádio posto ao colo, ofertava
a quem passava, um fraternal "boa noite fulano de tal."
Conhecia a todos. Moradores e comerciantes da sua rua e adjacências
retribuíam com satisfação o boa-noite de seu Lauro. Naquele tempo, mães, pais,
avós, tios, vizinhos, eram autoridades presumidas, dignas de respeito e
consideração. Os valores morais eram outros. Não se duvidava do caráter
das pessoas. Por preservar estes valores, seu Lauro podia desfrutar de
sua calçada e ter a porta aberta nas noites quentes de verão.
Era uma rua
residencial. O comércio existente na época, resumia-se ao armazém de Raimundo
Marques, de onde saía o misto de Isidoro para Tibau; Rubens Pinto & Cia; a
padaria de seu Eli; o armazém de seu Chiquinho Andrade, alguns poucos
cafés, e já no final do quarteirão, a serraria de seu Otávio. Em tempo: havia
também a academia de jiu-jitsu do Dr. Diniz Câmara, que funcionava na sua
própria casa. Homem forte e robusto, no tatame distribuía golpes pra todo lado,
para infelicidade geral dos seus magérrimos alunos. Se não me falha
a memória, este era o comércio da rua Mário Negócio naquele tempo.
A rua era
uma tranqüilidade. Poucas pessoas possuíam veículos e na maioria das vezes,
andavam a pé, já que não existia ainda transporte coletivo, a não ser os táxis
do Posto Cinco e Santa Luzia. Imagine quantas pessoas passavam pela calçada de
seu Lauro ofertando-lhe um sonoro "boa-noite" quando não
paravam para trocar algumas palavras..
Impreterivelmente,
todos os dias, às 5 horas, a pé, fazia sua peregrinação matinal ao
Mercado Público. Lá era o ponto de encontro de amigos e compadres, comparsas
das doces prosas matinais. Havia o açougueiro João Tobias, o gazeteiro seu Tico
já com "O Mossoroense" , "novinho em folha", e Antonio
Bezerra, com seu armazém de cereais.
Fui várias
vezes com ele ao Mercado, menino-criança, cheguei a participar algumas
vezes de sua roda de amigos. Todos sorriam em paz e faziam graça sobre coisas
simples que hoje não vemos mais.
Ao retornar
para casa, deixava a feira e partia para o trabalho. Ia embora, como
sempre foi: a pé, apesar do corpo pesado e do joelho doente. Era avesso a
médico. Assim como partia, chegava: cansado e ofegante, mas sempre sorrindo.
Apesar das
adversidades que a vida lhe proporcionava, sempre encontrava um coração
afetuoso que lhe dizia para seguir em frente. Era Dolora, sua esposa,
minha avó e mãe, que trazia consigo a fé do mundo todo, buscando em Deus e em
Santa Luzia, a mágica divina de poder criar e educar bem os seus sete filhos:
Lauro, Danilo, Margarida, Concita, João, Carmem e Guga, e de quebra, Coné e
Noemia.
Lauro da
Escóssia viveu com completo desamor ao dinheiro. Sua vida era a família, O
Mossoroense e a Maçonaria que ele tanto amou.
Não me cabe
aqui falar da sua importância para a imprensa potiguar. Todos já sabemos. Só
não sabíamos como era o dia a dia do homem que deixou marcado na sociedade
mossoroense, sua luta, seu amor ao trabalho, a paixão pelas coisas de sua
terra. Encontrei no livro de Francisco Obery Rodrigues, Rua Coronel Vicente
Sabóia, coleção mossoroense, série "C" vol.1180, pg.86, uma bem
próxima descrição do meu avô: "Era assíduo e dedicado ao jornalismo. De
temperamento ardoroso, foi um profissional combativo, parecendo ter sido o que
herdou, em maior grau, o ardor cívico, o denodo e a coragem de Jeremias da
Rocha Nogueira...Participou ostensivamente da política, sempre na defesa dos
interesses de nossa terra."
Lauro da
Escóssia deixou para nós exemplo de vida e coragem, levantando uma bandeira
de paz e profunda consciência política e social. Este era Lauro da
Escóssia. Seu Lauro para uns tantos outros, vôzinho para mim.
FONTE - JORNAL O MOSSOROENSE
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